O brincar e o brinquedo
O importante é o Brincar, e não o brinquedo, porque criança brinca, até mesmo, com “sucatas”. Há pouco tempo atrás, presenciei duas crianças, do sexo feminino, com idade aproximada de 3 anos e meio, “brincando de tomar suco”. A sucata que elas utilizaram eram duas tampas de uma determinada bebida. O que falaram durante a brincadeira não pudemos saber, mas riam muito, indicando que ali havia algo de muito satisfatório. Para que é necessária a brincadeira. O ser humano nasce imaturo, extremamente frágil, e por esta razão precisa de um adulto experimentado que lhe assegure a vida, não só biológica – os cuidados com a higiene, alimentação – mas, também, que lhe assegure a vida psíquica.
Para esta última – vida
psíquica - é importante que os adultos estabeleçam uma relação muito próxima
com a criança, e que a introduzam na palavra, na linguagem, bem como nas relações
com seus familiares, amigos, enfim, com a sociedade. Esta é uma posição de
total dependência da criança em relação aos adultos.
Mas, o ser humano não pode
permanecer nesta dependência. É importante que ele, à medida que cresça
fisicamente, vá, aos poucos, aprendendo a cuidar de si mesmo. Por exemplo, do
ponto de vista psíquico, a criança precisa aprender a falar, a ter suas ideias,
seus pensamentos, a construir sua “cabecinha”, sua vida psíquica.
Nas suas relações com o mundo a
sua volta, e pela sua total dependência dos adultos, a criança é submetida, por
exemplo, a ausências da mãe, e muitas outras situações que lhe provocam
angústia. Um exemplo: Uma menina de 4 anos estava muita nervosa diante da ausência
prolongada da sua mãe. Um dia, ela montou uma brincadeira com uma outra menina
de 2 anos. Dizia que era a mãe da criança de 2 anos, e falou o seguinte, em
determinado momento:
“Agora, você vai ficar aqui, eu
vou embora, e outro dia eu venho pra ver você de novo. E não chora, que eu vou
te dar uma bala.”
Esta menina de 4 anos estava
tentando articular, através de uma brincadeira, a angústia que sentia diante da
falta de visitas de sua mãe. Neste brincar, ela procurava sair de uma posição passiva
para uma posição mais ativa, que não lhe deixasse tão nervosa.
Como as crianças não sabem
falar ou articular os pensamentos da mesma forma que um adulto, elas necessitam
do brincar para poder ir estruturando seu mundo psíquico, sua cabecinha. O
brincar é uma forma de uma criança falar, é uma forma de comunicação.
O brincar em nossa época
Estamos presenciando, nos dias
de hoje, que o brincar e os brinquedos estão adquirindo uma outra dimensão.
Ouvimos do Dr. José Outeiral, em recente conferência ocorrida em nossa cidade,
que está havendo uma des-invenção da infância e uma des-invenção do brincar. Ou
seja, a infância e o brincar não cumprem as mesmas funções que em outras épocas
cumpriam. Já não há mais o período em que as crianças brincavam para construir
as suas ideias, os seus pensamentos, o seu mundo psíquico.
Segundo o conferencista acima
mencionado, estes pequenos seres estão sofrendo um processo de erotização “fora
do prazo combinado”: por exemplo, algumas meninas vestem-se da mesma forma que
algumas bonecas muito em voga em nosso comércio.
As crianças não precisam destas
bonecas, ou de robôs. Elas precisam do brinquedo para brincar, e assim
estruturar o seu mundo psíquico, para se tornarem adultos que amam, e trabalham.